sábado, 21 de março de 2009

vestido de baile

I

azul piscina
azul
todo cetim e todo brilho
minha mãe
mergulhada no vestido

anos sessenta
o baile
luvas de pelica
perfume fleur de rocaille
ligas segurando as meias
teias
de tão finas

a festa escrita no vestido

nele
o champanhe derramado
o suor da valsa impregnado no tecido
o carimbo em forma de lábio
do batom

hoje não mais a festa
em outro calendário
contados dias meses anos

a cabeça velha
olhando os panos
se enche de lembranças

morto
o vestido ao chão sem o seu corpo


II

Volta a si
como de um sonho

medonho
é morrer pelas lembranças

olha à janela

alguém apressado
se move em zig zag
como dança

vê outro azul
piscina
no céu de brigadeiro

é janeiro
como tantos outros refletidos
nos seus olhos velhos embaçados
igual em tudo aos tempos idos

é verão na praça

o casal de namorados
trava sua batalha de beijos
e de brigas

duas amigas par e passo
e crianças
pequenas esperanças
brincam

outro alguém vestindo azul
espia da janela
bela
como ela
no passado

quando se volta
olha o vestido
no chão do quarto
derramado

e não comete engano
quando sente

tem trinta anos
novamente

a minha mãe

Angela Nabuco

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