segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

bruxas e rugas

Quando menina, eu tinha duas fantasias: uma boa e outra muito, muito má.
A primeira era a de nunca ficar velha. Morrer seria imperativo, mas, de tão distante, beirava o impossível. Quanto ao morrer, portanto, eu não me ocupava.
Mas... ficar velha? Inconcebível!
Teria para sempre - o sempre das histórias infantis, aquele do “foram felizes para sempre” - para todo o sempre, aquela cara de menina, aquele frescor e aquele viço.
Outra fantasia povoava as minhas noites de medo e, se eu dormisse, os meus pesadelos. E, por mais eu tentasse fugir dela, retornava insistente e perigosa. Eu imaginava que todos, invariavelmente todos, eram bruxas! Todos à minha volta e mesmo aqueles a quem eu queria bem um dia se revelariam: retirariam as suas máscaras e sobraria somente eu no mundo, à mercê delas, sozinha e indefensável, e sabe Deus o que viria depois...
Os anos foram se passando devagar, como costumam passar os anos: lentos e inexoráveis. Quando nos damos conta, já se foram uma dezena, uma dúzia, dúzias de anos.
A minha cara de menina, já a perdi há muito, mas dignamente, com orgulho até! As primeiras rugas surgiram debaixo de espanto, mas logo as esqueci: eram pequenas e o tempo era pouco para me ocupar delas. Foram se seguindo outras, e as fui incorporando ao meu patrimônio histórico pessoal.
São companheiras que verifico diariamente pela manhã diante do espelho, espelho meu: há alguém mais conservada do que eu?
E há os cremes, verdadeiras poções mágicas, a reposição hormonal, a ginástica; enfim, um batalhão, um exército que ajuda a convencer o meu corpo de que tem lá seus trinta anos no máximo. Botox? Plástica? Nem pensar! A dor é pior do que as rugas, e tiraria a marca registrada do meu passado, aqui impresso em meu rosto. Como apagar de vez as minhas lembranças?
Quanto às bruxas, deparei-me com várias pela vida a fora. Algumas com cara de fadas, mas não me meteram medo! E vieram as fadas, algumas com cara de bruxas, que coloriram a minha vida quando ela estava em preto e branco, monótona ou triste.
Descobri que todos temos um pouco de bruxa e de fada sob as nossas máscaras humanas. Em lidar com ambas é que se resume toda a ciência e toda a arte: com uma pitada de pó de pirlimpimpim é que se tempera a mistura certa que faz essa vida valer a pena.
A estas fadas e bruxas e às minhas rugas, o meu muito obrigada, pois me fizeram acreditar que tudo é possível, mesmo me tornar uma velha com alma brincante de criança.

Angela Nabuco

5 comentários:

  1. Movimento e vida
    Mover-se para e por algo
    Colocar, retirar, modificar,
    Tornar-se num desejo viceral e fiel
    De ser para nunca se perder de ser
    Sem ter que
    Simplesmente porque se é
    Não há como fugir disso
    Que simples só se torna pelo desejo
    Se fugimos nos entregamos a ignorância
    Não movimento
    Não arte
    Apesar do que se discuti
    Se movimentar em torno disso
    O não movimento na sua vida
    Não cabe, não faz parte
    Você é movimento em arte.

    Gabriele Generoso

    Fiquei tão emocionada com seu blog...com seu movimento para a arte qeu me moveu, depois de alguns meses "ausente" da escrita. Não tenho cópias ta? saiu agora, esse e espero que atrás dele venham outros.

    Beijos!!!!

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  2. Angela!
    Que surpresa agradável! Que bom você ter decidido compartilhar seu talento através de um blog. Estou maravilhada com seus escritos e sua arte.
    Beijos e saudades.
    Helô (do Boris) :))

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  3. Angela,

    Fui sua colega no curso de autoficção e adorei seu blog! Parabéns pela coragem! bjs Maria Teresa

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  4. Helô e Maria Tereza, dividir com vocês é o meu maior prazer!
    Gabriele, que lindo, obrigada!
    Angela

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  5. eu tambem estuo emocionada e muito por ter partilhar este blogg cheio de coragens emoçoes amor respeito e belissimas artes de expresar os sentimentos e mostrar a vida aos poquinho a realidade de cada mulher e criança que esta dentro de noss
    obrigada angela
    anne

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